domingo, 30 de dezembro de 2007

HC: O BALANÇO QUE NÃO FOI FEITO

Um dos privilégios dos paulistanos é contar com um hospital da importância do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Descontando o entusiasmo de alguns de seus admiradores, entre os quais me incluo, é necessário reconhecer os méritos de sua atuação, não apenas no quesito assistência médica – 4.000 consultas e mais de 120 cirurgias por dia, com todo seu desdobramento representado por exames de laboratório, aplicação e fornecimento de medicação gratuitos – mas também numa série incontável de serviços, como formação de novos médicos, psicólogos, fisioterapeutas e nutricionistas especializados em atendimento hospitalar.
O incêndio de 25 de dezembro constitui grande tragédia para as pessoas que estão privadas da assistência prestada pelo hospital, com ressarcimento – embora insuficiente – do Sistema Único de Saúde. Estão aí os depoimentos, colhidos à porta do Prédio dos Ambulatórios todos os dias, desde o infausto acontecimento. Pessoas que se deslocam de cidades distantes, inclusive de outros Estados, para iniciar ou dar continuidade a tratamentos que não existem em seus respectivos municípios, voltam chorando, por não saber se continuarão vivas sem as consultas e os medicamentos gratuitos.
Pouco se divulgou a respeito do Prédio dos Ambulatórios, que abriga desde creche de filhos dos médicos e servidores, banco de sangue (Fundação Hemocentro), Laboratório Central, Arquivo Central, consultórios de várias especialidades, Farmácia Industrial, centro cirúrgico e heliponto.
Cada um desses itens constitui um mundo à parte. O Laboratório Central, por exemplo, responde por cerca de 3% da produção nacional na área de pesquisa. Toda sua produção depende fundamentalmente de energia elétrica, com sangue coletado e armazenado todos os dias.
A Farmácia Industrial produz quase metade do consumo de medicamentos do hospital. O Arquivo Central reúne prontuários do Instituto Central desde 1944, quando o HC foi inaugurado. São tantos documentos, que foi preciso transferir parte do acervo para o Hospital Auxiliar de Suzano, onde foi construído um prédio especialmente para esse fim.
O Centro Cirúrgico não tem similar no Brasil, quiçá em nenhum lugar do mundo. Conta com 32 salas de cirurgias equipadas com o que existe de mais moderno, e com uma sala de recuperação pós-operatória (UTI) anexa. Foi talvez o setor mais atingido pela fumaça, que subiu pela tubulação de ar-condicionado. Duas dessas salas destinam-se às emergências, atendendo inclusive os casos graves que chegam diariamente de helicóptero.
As mesas de cirurgia, produzidas por conhecida multinacional, dispõem de sistema de iluminação de emergência, que entra em ação em segundos, no caso de falta de energia. Por que não funcionou, ninguém sabe ou explica.
Encontram-se, ainda, no Prédio dos Ambulatórios, o Centro de Reprodução Humana, que armazena embriões para fertilização assistida (in vitro), e um banco de peles, que também depende de congelamento.
Como se vê, os prejuízos causados pelo incêndio, de origem ainda desconhecida, são maiores do que se imagina e se divulga.
Ao invés de apenas buscar culpabilidades, o mais importante no momento é proceder às reformas necessárias ao pleno funcionamento dos serviços. Para isso não faltam disposição das autoridades e boa vontade dos médicos e servidores, cuja dedicação nem sempre é reconhecida, tampouco recompensada.

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