terça-feira, 15 de outubro de 2024

FALTA DE ENERGIA ELÉTRICA ATINGE ATÉ RONNIE VON

 

Quando iniciei no jornalismo notícia era um fato incomum, que chamasse a atenção por um motivo especial. A norma era informar sem isenção, deixando ao leitor o direito de pensar o que quiser. Agora tudo é notícia, qualquer coisa. Quem protestava era o povo, reclamando das más condições das calçadas, da conta de luz, da falta d’água, enquanto os menos pobres se queixavam dos buracos das ruas ou das estradas, que danificavam seus veículos.

Hoje tudo é notícia e até moradores do Morumby, bairro nobre de São Paulo, abrem a boca contra tudo e contra todos. Nem precisa esperar Datena. Qualquer pessoa bota a cara no celular e destila seu ódio contra tudo e contra todos. O cenário pode ser qualquer um, desde a sala de sua casa até os baixos de um viaduto. A internet conseguiu o que nem Marx nem Lenin jamais sonharam: direitos iguais para todos.

Daí a estranheza ao ver a indignação de Ronnie Von. Morando numa mansão de não sei quantos metros quadrados, com piscina, aquário, quintal, galinheiro, etc.

Somelier assumido, se mostra revoltado pela falta de energia elétrica que afeta a temperatura amena de sua farta coleção de vinhos importados. Como saciar dignamente eventuais visitantes? Só comprando um gerador de energia elétrica!

Um absurdo, diz ele, numa postura que foge à habitual finesse. Não combina. Ele que fez sua carreira baseada em nobreza, desce ao ponto de se dizer uma pessoa do povo, sofrendo as consequências da falta de energia elétrica! Como os tempos mudam!

 

terça-feira, 8 de outubro de 2024

DESPERTADOR


O samba-canção "Despertador" foi composto por mim por volta de 1955, quando fazia serenatas em Caruaru, acompanhado por romero de Figueiredo. Na verdade, era ele que cantava e eu acompanhava ao violão. Este é, pois, um resgate daquela época. A letra é a seguinte:


DESPERTADOR

Resta-me um despertador
que ela me deu
Marcou horas de ventura
hoje marca os prantos meus.
Não posso me conformar
se tão longe dela estou
Quantas horas de ventura
marcou meu despertador

Eu quero sofrer calado,
mas não posso
A saudade no meu peito
me deixa remorso

Porém agora,
aumentando a minha dor
ouço o bater apressado
deste meu despertar (bis).

BIG BAND DA SANTA TOCA NO MUSEU DA CASA BRASILEIRA

A Big Band da Santa se apresenta no próximo domingo às 11 horas no Museu

da Casa Brasileira, comemorando dez anos de sua criação.

Na oportunidade, lançará seu primeiro CD, que inclui peças escritas exclusivamente para o

grupo. Entre os compositores, destacam-se, além, de Tiné, arranjos para

músicas de Toninho Horta, Chiquinha Gonzaga, bem como peças de Gilberto

Assis, Leonardo Muniz e Eduardo Puperi.

A banda é formada por alunos e ex-alunos da Faculdade Santa Marcelina, e

músicos convidados. Desde sua criação tem como regente o maestro Paulo

Tiné, um dos professores daquela instituição, que também está lançando um disco

independente, do Paulo Tiné Quarteto, onde atua como violonista e

guitarrista.

A Big Band da Santa é uma das integrantes do Movimento Elefantes, que

reúne 10 bandas. Trata-se de iniciativa destinada a buscar espaço num mercado

sabidamente dominado por repertórios essencialmente comerciais.

Os encontros musicais do Museu da Casa Brasileira já se transformaram numa

tradição aos domingos, reunindo um público aberto a todas as tendências. A

partir de setembro, o projeto Música no Museu tem Curadoria de Arrigo

Barnabé.

OS 70 ANOS DE RONNIE VON


Ronnie Von faz 70 anos e ganha, merecidamente, excelente reportagem de Júlio Maria no Caderno 2 do Estadão. Decepcionado com a carreira de cantor, ele se transformou em bom apresentador, conquistando principalmente o público feminino, que costuma aplaudir sua elegância e sua beleza física - mais do que sua voz.
Realmente, seu programa na TV Gazeta tem certo bom gosto, embora nem tudo seja de bom gosto. Na entrevista, Ronnie condena o jabá – tendência que condiciona o sucesso à compra de “espaços” na mídia para alcançar o sucesso.  Sem nenhuma contrapartida mostra em seu programa alguns cantores sem a menor expressão, que valem mais pela amizade ou pelas ligações familiares do que pelo eventual talento.
Quando o conheci, vindo de Niterói para aventurar-se no promissor mercado paulistano, Ronnie já era casado com Aretuza e se instalou num apartamento da avenida Santo Amaro. 
Nas primeiras entrevistas impunha uma condição: não contar nada sobre seu estado civil. Na época, década de 60, era comum tentar iludir as fãs com uma solteirice, o que transformava os astros em candidatos naturais a um romance, ou marido, sei lá. Assim, nenhum cantor, não apenas Ronnie Von, dizia se era casado.
Numa certa reportagem, quando ele atingiu o auge do sucesso com “Meu bem”, a revista Intervalo, que circulava às quintas-feiras, decidiu de última hora dedicar-lhe a capa e pediu-me a elaboração de um texto às pressas, considerando que eu já fizera algumas entrevistas com ele e conhecia melhor do que ninguém sua trajetória de iniciante. Ronnie se apresentava todos os domingos no programa Jovem Guarda, comandado por Roberto Carlos na TV Record. E eu estava lá.
 Perguntei ao chefe de reportagem Gilberto Di Pierro se poderia escrever o que quisesse e ele disse sim. Foi quando contei que Ronnie era casado. No dia seguinte, lá estava ele na redação da Marginal do Tietê, com empresário e advogado, protestando contra minha indiscrição. Após a devida acareação, na sala do diretor da revista, Odilo Licetti, deixei a sala convencido de que estaria demitido. Qual o quê. O diretor conseguiu de alguma forma minimizar a questão. Mesmo porque não havia nenhuma mentira.
O programa de Ronnie Von na TV Gazeta caracteriza-se por prestigiar pessoas e eventos de fino trato. Embora nem tudo o seja de fato, como sugiro no início deste comentário. Diante do festival de horrores da programação geral das TVs, chega a ser recomendável. Hoje, já não seria tão implacável quanto o era ingenuamente ao assinar coluna sobre televisão no jornal A Gazeta, com o sobrenome de Zé Flávio.


quinta-feira, 24 de maio de 2018


FLÁVIO TINÉ LULA DA SILVA

Tenho pensado muito em alternativas. Preciso de algo que substitua o noticiário, modifique a rotina, traga novas tarefas para ocupar o tempo que se perde ouvindo cachorro latir, telefone tocar e a secretária do lar reclamando da falta de açúcar, café ou banana.
Não adianta dar dinheiro para suprir tais necessidades, porque outras queixas hão de surgir. Pode não faltar gás, mas quebra-se um copo, a vassoura não presta mais, ou lá vem aquele vizinho perguntar se tem jornal velho para as necessidades do cachorro dele. Sou dos poucos que ainda compram jornal de papel, e ele sabe disso.
Uma das vantagens do ócio é descobrir na televisão documentários sobre a vida e a obra de Paco de Lucia. O pai era violonista, daí sua paixão pelo flamenco. Meu pai também tocava violino na igreja e nem por isso virei músico. Apenas arranho algumas notas ao violão.   
Quero apenas acordar de madrugada ouvindo Silvio Caldas. Sei que é difícil cantar como ele, tocar como Baden Powell, compor como Vinicius. Mas é fácil curtir. Às vezes passo a madrugada ouvindo música.
Outro dia, um médico sugeriu que parasse de sonhar. Chega de Gisele Bündchen, Bruna Marquezine e musas que tais. Daí, me apaixonei pela pianista russa Olga Scheps (vide YouTube).
Já que não sei escrever como Osman Lins nem cantar como Mônica Salmaso, contento-me com a imagem das mulheres bem-sucedidas do Facebook ou com as companheiras da hidroginástica.
Só não me peçam para acrescentar Lula no nome. Sou apenas Flávio Tiné, e olhe lá...


sexta-feira, 18 de abril de 2014

CRIATIVIDADE E ÓCIO


Durante algum tempo acreditei que o ócio é um grande amigo da criatividade, como dizem. Para compor uma música, fazer um soneto, escrever um romance ou pintar um quadro é necessário bocejar, espreguiçar-se, andar à toa, olhar o céu e as estrelas e despojar-se de toda a ansiedade que caracteriza a vida moderna.
Acreditei nisso, ao ponto de assistir o Programa Silvio Santos, passar tardes inteiras no parque do Ibirapuera, acompanhar desfiles nos corredores dos shoppings e tomar cafezinho nos bares à porta de academias. Só não tive coragem de frequentar os cinemas de filmes pornô da avenida São João e transversais, pois aí seria baixaria por demais.
Já me surpreendi nas calçadas da 25 de Março, mesmo não querendo nem tendo absolutamente nada para comprar. Queria apenas ver in loco e em cores o que é que esta rua tem. Estendi os passos até a praça da Concórdia, no Brás, e fiz questão de ir à portaria do Hotel Cavaleiro, na rua do mesmo nome, só pra conferir o quarto em que dormi dois ou três dias ao chegar do Nordeste há 50 anos com vinte cruzeiros. Surpresa: o hotel ainda existe. De lá fui resgatado pelo amigo Caio Gracco Prado, que gentilmente me hospedou em sua própria casa até conseguir emprego na Editora Abril. Chegara do Nordeste numa Kombi, espécie de pau-de-arara sofisticado, que demorara uma semana entre Caruaru (PE) e o Brás, com dez pequenos comerciantes que vinham comprar jeans, então em moda no Agreste pernambucano.
Em busca de novidades para o ócio frequentei todos ou quase todos os parques, teatros, praias, cidades, tudo enfim que enleva e distrai. Fui certa vez ao topo do Word Trade Center, de saudosa memória, só para avistar lá embaixo, bem pequenininha. a Estátua da Liberdade. Outro dia, faz tempo, me surpreendi em Oxford Street, abestalhado com tantas diferenças de raças, trajes e trejeitos.
Nada disso adiantou. Tampouco os cursos de criatividade ministrados por escritores, jornalistas, faculdades e os vários livros a respeito que devorei, aproveitando a tal ociosidade. Donde se conclui que a ociosidade não estimula a criatividade, algo que ninguém ensina e ninguém aprende.
Dizem, finalmente, que só com muito suor se cria alguma coisa. Mesmo assim, o calor dos últimos dias não confirmou nada até agora. Quem sabe uma sauna resolva esse problema por enquanto insolúvel.

terça-feira, 8 de abril de 2014

OS 30 DIAS MAIS INESQUECÍVEIS DE 1964


No dia 31 de março de 1964 eu era repórter do jornal Última Hora/Nordeste e assessor de imprensa da prefeitura do Recife. O jornal apoiava o governador Miguel Arraes e o prefeito Pelópidas Silveira e eu me alinhava conscientemente nas diretrizes vigentes, fazendo a ponte entre as autoridades constituídas e a imprensa. À noite, o jornal foi cercado e invadido por um grupo de militares do Exército, que inicialmente pretendia prender todos os jornalistas mas, após negociação, concordou em levar apenas os chefes da redação e de reportagem, soltos tão logo esclarecido que não tinham vínculos com partidos políticos.
Antes de ser assessor de imprensa da prefeitura eu era setorista na Câmara Municipal, conhecendo todos os projetos de interesse do município e obviamente todos os vereadores, com quem conversava e entrevistava diariamente. 
Nos dias que se seguiram ao fechamento do jornal passei a frequentar a Associação de Imprensa de Pernambuco, na avenida Dantas Barreto, onde me supunha seguro, embora soubesse que jornalistas de todas as tendências também andavam por ali. A AIP dispunha de ótimo restaurante, para onde acorriam também intelectuais e artistas. Além disso, havia uma sala de bilhar e sinuca, ambiente de agradável convivência. Passava as tardes jogando com o amigo e colega Claudio Tavares e paquerando a filha dele, Eva, secretária da AIP. 
Certa tarde, comecinho da noite, ao sair do prédio e me dirigir ao parque 13 de Maio para encontrar outra namorada, fui seguido sem perceber por um jeep do Dops, quando alguém bateu no meu ombro e lascou  o tradicional "teje preso"!
Ao lado dos policiais encontrava-se o vereador José Silvestre, vingando-se do perigoso jornalista que denunciara esquema de corrupção. A Câmara Municipal destinava cerca de 5 mil cruzeiros para cada vereador gastar a seu bel-prazer. O próprio vereador fizera a denúncia e por causa de sua repercussão passou a ser odiado pelos demais. Com o golpe, passou a auxiliar a polícia no meu encalço e fez questão de me entregar pessoalmente ao temido delegado do DOPS, Álvaro da Costa Lima. 
Fiquei alguns dias num banco de madeira, lado a lado com outros presos, dormindo sentado. Depois fui transferido para um pequeno xadrez, de mais ou menos 4m2, conhecido como buque, que dividia com vários outros presos. Dormíamos no chão. A comida era uma marmita insuportável. Por isso, chegava a receber até três almoços, dois das namoradas e um de minha irmã Conceição. Dividia com os companheiros, claro.
Trinta dias depois fui chamado para um interrogatório em que as principais acusações eram pertencer à Associação dos Amigos  da União Soviética, ter ido a Cuba a convite de Francisco Julião e ser comunista, naturalmente. Como prova de minha perigosa atuação mostraram-me fotos de uma entrevista coletiva do governador Miguel Arraes no Salão Nobre do Campo das Princesas. Eu estava entre os entrevistadores. Em outra foto, eu aparecia ao lado de Caio Prado Júnior na Plaza de la Revolución José Marti, Havana.  
Dadas as devidas explicações fui solto com a recomendação de que não poderia me afastar de minha residência, pois seria chamado novamente. Queriam a todo custo que eu declinasse os integrantes da "base" dos jornalistas do Partido Comunista Brasileiro no Recife. Os nomes eram notórios, mas eles queriam colocar-me como informante. Recusei-me, logicamente, e insisti: sou apenas um jornalista. Alguns dias depois, os jornais estamparam a relação dos jornalistas do Partidão, segundo outro depoente. 
Ao deixar o buque da rua da Aurora viajei para Caruaru e de lá peguei uma Kombi com onze pessoas que iam fazer compras em São Paulo, onde moro até hoje, traumatizado pelos 30 dias mais inesquecíveis de minha vida.